sábado, 31 de agosto de 2013

"Vista Minha Pele" e saberás...

Tardiamente tive a oportunidade de assistir ao curta de ficção de Joel Zito Araújo, "Vista Minha Pele", que com uma sacada bem elaborada questiona as relações e o tratamento do negro na sociedade brasileira. Não deveria ser surpresa, nem muito menos uma ideia genial, já que que conhece minimamente este país e como sua cultura vigente foi elaborada ao longo de séculos, já tem a noção de como as diferenças sociais e raciais são tratadas. Não se consegue lidar com as diferenças e muito menos respeitar as igualdades. 

Embora eu seja daquelas que vê o novo Brasil com bons olhos diante de todas as manifestações que tomam as ruas, todas as políticas públicas que tentam resgatar uma política que deveria ser pensada anteriormente e todos os movimentos negros e conscientizações que estão ganhando forças, eu não ignoro de forma alguma, nem mesmo fecho os olhos, sobre o preconceito racial ainda latente e, talvez, mais "sofisticado" que ainda domina nosso país.



Voltando ao filme, produção de 2003, temos a história invertida a tudo o que conhecemos: uma garota negra, de classe alta, numa boa escola, onde todo o sistema coloca a negritude em evidência na publicidade, nas novelas, nos melhores cargos, enfim, na dominância. Do outro, temos sua melhor amiga, Maria, branca, vítima de um preconceito da sociedade, moradora da periferia que está lutando dia após dia para ser aceita na escola, onde ocupa um lugar de bolsista. A reflexão sugerida por Joel foi: e se fosse ao contrário? E se os brancos tivessem sido os escravizados? E se os brancos fossem os marginalizados de todo o sistema brasileiro? E se hoje fossem os brancos os que estivessem lutando pela igualdade? A resposta é simples: "Vista a minha pele".

Esse filme vai de encontro com outro curta de ficção, mais recente, de Juliana Vicente, "Cores e Botas". Nele não há inversões de papeis, mas existe uma figura central que também luta dia após dia para ser aceita, mesmo sendo de classe média alta. No filme de Joel Zito, Maria quer ser a Miss Festa Junina, mas esse cargo só é ocupado pela menina negra mais popular do colégio anualmente. No filme de Juliana Vicente, a figura central, negra, quer ser a paquita de um concurso, mas para ser paquita, não poderia ser negra.



Dois filmes belíssimos para uma reflexão profunda. Encerro esse texto com os questionamentos de Maria na sua inversão de papéis:

"...Mas na verdade, depois de todas essas aventuras, algumas perguntas continuam me incomodando. Será que um dia a escola vai valorizar a diferença racial? Será que negros, brancos, índios e orientais vão ser tratatos em condições de igualdade? Será que um dia eu vou ver nos cartazes espalhados pela escola pessoas parecidas comigo? Será que os professores, um dia, vão contar que os brancos também construíram esse país? Será que encontraremos nos livros escolares imagens, história dos nossos avós? Será que a desigualdade racial vai deixar de ser um problema só para os brancos? às vezes eu acho que sim. Mas outras vezes eu acho que não. E você, o que você acha?"

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